top of page

glossário

REGIONALISMO CRÍTICO

Regionalismo.jpg

  Junto à implantação adequada da Casa de Chá Boa Nova, de Álvaro Siza Vieira, dialogando com a materialidade e técnicas locais, contrapõe-se a obra High-Tech e expressivamente genérica do 30 St Mary Axe, de Norman Foster. Colagem dos autores.  

É possível argumentar que o Regionalismo Crítico enquanto estratégia cultural seja tanto um portador da cultura mundial quanto um veículo da civilização universal. [...] A respeito disso, a prática do Regionalismo Crítico depende de um processo de dupla mediação. Em primeiro lugar, deve “desconstruir” o espectro geral da cultura mundial que ele, inevitavelmente, herda; em segundo lugar, deve alcançar, por meio da contradição sintética, uma crítica declarada da civilização universal. [...]

Kenneth Frampton, “Towards a Critical Regionalism”, In: The Anti-aesthetic, 1983. [ p. 21, grifos do autor, tradução nossa ]

Igor Mineiro Oliveira

Vinicius Oliveira de Freitas

[ jun. 2021 ]

remissivos

Expressões regionais da arquitetura, bem como uma perspectiva regionalista sobre o pensamento da cidade e do território, fizeram-se presentes desde a primeira metade do século XX. No primeiro caso, como expressões da arquitetura moderna vinculadas a trajetórias individuais ou recortes de produções nacionais, produzidas no entreguerras ou no imediato pós-Segunda Guerra (LEFAIVRE e TZONIS, 2003). No segundo caso, como desenvolvimento do pensamento sobre o Planejamento Regional, especialmente a partir das contribuições de Patrick Geddes e Lewis Mumford (MUMFORD, 1970). Ao final do século, no entanto, ocorre um novo adensamento de proposições sobre o regionalismo, impulsionado tanto como reação ao pós-modernismo como em função do contexto mais amplo da globalização.

Ainda que este não seja, igualmente, um fenômeno novo, podendo remontar às navegações e colonizações dos séculos XV-XVI, o termo “globalização” foi difundido a partir dos anos de 1980 para tratar da integração econômica global e da desregulação de economias nacionais. Nesta condição mais recente, a globalização opera como uma expressão recente do sistema capitalista, reforçando de sua hegemonia como modelo de desenvolvimento e organização social. Muito embora tenham sido criados poderosos discursos apologéticos com relação às potencialidades da eliminação de fronteiras, analistas críticos do fenômeno identificaram, ainda nos anos 1990, que a globalização tornou mais evidentes o abismo entre centro e periferia (SANTOS, 2001).

Na interseção destas preocupações, a partir dos anos 1980, emerge e ganha projeção internacional o debate sobre o Regionalismo Crítico, mobilizado por Alexander Tzonis e Liane Lefaivre (1981) e, especialmente, Kenneth Frampton (1983; 2003). A análise sobre o sentido dado ao termo exige cuidado, pois não se trata de uma produção vernácula, muito menos artesanal, assim como não deve ser associado a uma atitude nostálgica. Trata-se, antes, de uma questão de adaptação da tecnologia moderna em função das condições do local e de sua cultura. Uma das características dadas por Frampton parece resumir este aspecto central:

[...] Pode-se afirmar que o Regionalismo crítico é regional na medida em que invariavelmente enfatiza certos fatores específicos do lugar, que variam desde a topografia, vista como uma matriz tridimensional à qual estrutura se amolda até o jogo variado da luz local que sobre ela incide. A luz é sempre entendida como o agente básico por intermédio do qual o volume e o valor tectônico da obra são revelados. Uma resposta articulada às condições climáticas é um corolário necessário a tal especificidade. O Regionalismo crítico, portanto, opõe-se à tendência da “civilização universal” de privilegiar o uso do ar condicionado, etc. Tende a tratar todas as aberturas como zonas delicadas de transição com capacidade de reagir às condições específicas impostas pelo lugar, pelo clima e pela luz. (FRAMPTON, 2003, p. 396-397)

Entendemos o regionalismo crítico como a união de um domínio da tecnologia disponível a elementos do território e da cultura local, a exemplo de materiais, processos e técnicas construtivas, clima e topografia, entre outros. Encontra-se certa dificuldade para caracterizá-lo de forma correta, encontrar uma coesão em seu entendimento e evitar polaridades fáceis, por isso devem ser consideradas outras expressões sobre o tema, a exemplo “regionalismo autêntico” (CURTIS, 1986) e do “internacionalismo crítico” (LABORATÓRIO URBANO, 2019, p. 75-76). Seria equivocado, por exemplo, considerar que o regionalismo crítico seja possível apenas em periferias globais, podendo também se desenvolver no centro global. Entendemos, ainda, que para caracterizar-se como regional, ou ganhar singularidade, a questão da tecnologia depende de fatores externos fora da alçada da arquitetura, como de política externa, diplomacia e condições favoráveis para trocas entre diferentes lugares do globo que quase sempre são incomuns na América Latina.

Em O Interior da História, a historiadora Marina Waisman (2013) amplia esse debate, tratando-o a partir da tríade Centro/Periferia/Região. Para a autora, uma melhor forma de enquadrar o “regionalismo” seria considerando o modo com que cada localidade se apropria da tecnologia, sem cair em determinismos sobre “progresso” ou “avanço” técnico e científico. Esta leitura busca evitar que a “pauta” dos países centrais seja usada para qualificar a produção do restante do mundo. A partir da autora, entendemos a complexidade das particularidades regionais, o que explica a ocorrência de regiões que conseguem desenvolver características peculiares, mesmo imersas em uma conjuntura em que seria impossível replicar a técnica mais avançada disponível no mundo. Por fim, destaca-se que Waisman traz uma reflexão crítica sobre a condição contemporânea como um todo, em que o domínio da tecnologia avançada serve de parâmetro e legitimador das posições (centrais ou periféricas) e na qual se mantém uma perspectiva ideológica da modernidade.

Rincões desse tipo podem ser entendidos como semelhantes no que tange a questão de locais que não tem acesso a tecnologia suficientemente refinada, isso quer dizer que fatores como clima, topografia, a própria logística e o custo de oportunidade fazem esse fenômeno comum, dessa forma é semelhante por acontecer também nas periferias globais bem como nos centros, entretanto é necessária cautela nessa análise, contudo traduzir isso em algo rústico muito menos vernacular como já exposto anteriormente é um erro conceitual, são apenas menos desenvolvido nesses termos postos no decorrer da explicação, o que levanta questões acerca de como o modelo de desenvolvimento posto tende a criar guetos afastados providos de pouca ou nenhuma tecnologia construtiva, tal qual lugares que mesmo longínquos por estarem em uma conjuntura desenvolvida tem acesso porém mais limitado; E burgos, com a cautela da palavra, onde se faz referência exatamente a fortificações nobres de outrora já relidas hoje como pequenas regiões no globo super tecnológicas que expressam exatamente essa ideia e progresso e poder como vitrine do que há de melhor em termos arquitetônicos mesmo que não o sejam mas tem a pretensão de serem. 

referências

CURTIS, William. Towards an authentic regionalism. MIMAR, Cingapura, n. 19, p. 24-31, jan./mar. 1986.

FRAMPTON, Kenneth. Towards a Critical Regionalism: six points for an architecture of resistance. In: FOSTER, Hal (ed.). The anti-aesthetic: essays on postmodern culture. Seattle: Bay Press, 1983. p. 16-30.

FRAMPTON, Kenneth. Regionalismo crítico: arquitetura moderna e identidade cultural. In: FRAMPTON, Kenneth. História crítica da arquitetura moderna. [3. reimp.]. Tradução: Jefferson Luiz Camargo. São Paulo: Martins Fontes, 2003. cap. 5, p. 381-397. 

LABORATÓRIO URBANO. Fazer por desvios. In: JACQUES, Paola Berenstein; PEREIRA, Margareth da Silva (org.). Nebulosas do Pensamento Urbanístico, tomo II: modos de fazer. Salvador: EDUFBA, 2019. p. 22-153. Disponível em: http://www.laboratoriourbano.ufba.br/wp-content/uploads/2019/03/002_Nebulosas-do-Pensamento-Urbanistico-Modos-de-fazer-Desvios.pdf | Acesso em: 21 mai. 2021.

LEFAIVRE, Liane; TZONIS, Alexander. Critical regionalism: architecture and identity in a globalized world. Munique; Berlim; Londres; Nova Iorque: Prestel, 2003.

MUMFORD, Lewis. The culture of cities. [ed. reimp.] San Diego; Nova Iorque; Londres: Harvest/ HBJ Books, 1970.

SANTOS, Milton. Por uma outra globalização. 6. ed. Rio de Janeiro; São Paulo: Record, 2001.

TZONIS, Alexander; LEFAIVRE, Liane. The grid and the pathway: an introduction to the work of Dimitris and Susana Antonakakis. With prolegomena to a history of the culture of modern Greek architecture. Architecture in Greece, Atenas, n. 15. p. 167-178, 1981.

WAISMAN, Marina. Centro/Periferia/Região. In: WAISMAN, Marina. O interior da história: historiografia arquitetônica para uso de latino-americanos. Tradução: Anita Di Marco. São Paulo: Editora Perspectiva, 2013. cap. 4, p. 83-98.

bottom of page