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glossário

PÓS-MODERNISMO

Pos-modernismo.JPG

   Detalhe da Piazza d’Italia (1979), em Nova Orleães, nos Estados Unidos. 
  Projeto de Charles Moore e Albert Perez & Associates. Foto de Leandro Cruz.  

Se o pós-modernismo cobre tudo desde o punk à morte da metanarrativa, dos fanzines a Foucault, como conceber que um único esquema explanatório possa fazer justiça a uma entidade de uma heterogeneidade tão fantástica assim? [...] Se há alguma unidade no pós-modernismo, ela só pode residir nas “semelhanças familiares” wittgensteinianas; e nesse sentido ele parece oferecer um exemplo instrutivo de seu antiessencialismo dogmático [...].

Terry Eagleton, As Ilusões do Pós-modernismo, trad. Elisabeth Barbosa, 2011 [1996]. [p. 25-26, ed. digital, grifo do autor].

Amane Lopes Bento Xavier

Júlia Souza de Miranda

[ jun. 2021 ]

remissivos

O pós-modernismo é um termo usado para designar mudanças ocorridas nas mais amplas áreas artísticas, sociológicas e científicas do século XX. Ao fim da década de 1970, o mundo vivia sob grande impacto das mudanças iniciadas após a Segunda Guerra Mundial. O colapso de valores presenciados durante a Guerra teve como consequências novas reflexões sobre os rumos da humanidade, até então não imaginados. Conforme Jürgen Habermas (1992), o sentido do prefixo “pós-” experimenta uma descontinuidade ou distanciamento em relação a uma forma de vida ou de consciência na qual anteriormente se havia confiado de maneira irrefletida. Entende-se que a pós-modernidade emerge como uma reação às inconformidades percebidas do Modernismo.

O conceito de pós-modernismo é extremamente polimórfico, não apresentando um consenso entre diversas teóricas e teóricos que se debruçam sobre ela. O próprio universo pós-moderno não é de delimitação, mas de combinação. Essa falta de contornos precisos tornou difícil, por muito tempo, chegar a uma conceituação clara do termo, como indicado pelo crítico de cultura Terry Eagleton (2011). Outro importante teórico do pós-modernismo, Fredric Jameson (1996), caracteriza-o como um conjunto de movimentos heterogêneos, cujo denominador comum está associado com a ruptura do movimento moderno. Avançando sobre a questão da ruptura, e retornando a Habermas, entende-se que a pós-modernidade se apresenta como uma antimodernidade, que ganha contornos políticos ao se estabelecem posições contrárias entre neoconservadores e críticos do crescimento econômico (HABERMAS, 1987; 1992).

No campo da Arquitetura, o pós-modernismo tem fundação simbólica na primeira Bienal de Arquitetura de Veneza, realizada em 1980. O manifesto de apresentação desse debate ao grande público, intitulado Strada Novissima, apresentava uma fantasiosa rua pós-moderna composta por vinte fachadas de três andares, abrigando exposições sobre a obra de arquitetos relacionados ao tema. Buscava-se um retorno ao passado, desmerecido pelos modernos, inspirando-se no modelo tradicional de rua, inteiramente diferente do que se habituou a ver nas utopias modernas. Com o tema “A Presença do Passado” [La Presenza del Passato], a Bienal criou as condições para um novo historicismo e para a retomada dos laços com a história.

Embora desaprovassem tal associação, as trajetórias de Robert Venturi e de Denise Scott Brown colocam-nos como importantes articuladores do debate sobre a arquitetura pós-moderna. Com o livro-manifesto Complexidade e contradição em arquitetura, de 1966, Venturi propunha uma arquitetura que incorporasse ambiguidades, produzindo espaços de riqueza simbólica, reconhecendo que a complexidade da vida contemporânea não admitia projetos simplificados (VENTURI, 1995). Já em Apendendo com Las Vegas, publicado em 1972 junto a Denise Scott Brown e Steven Izenour, a cidade comercial e seus letreiros surgem como lugar de reinvenção para a produção contemporânea e de recuperação do “simbolismo esquecido” da arquitetura. A partir da arquitetura dos cassinos, elaboram o conceito do “galpão decorado”, propondo uma desvinculação da fachada com o corpo dos edifícios, onde o corpo resolveria as necessidades funcionais e a fachada era dedicada ao aspecto simbólico da edificação (VENTURI, SCOTT BROWN e IZENOUR, 2003).

Em uma pesquisa sobre a arquitetura pós-moderna na cidade de Pelotas-RS, Juliano Coimbra (2007) depreende uma unidade legível em meio à diversidade. Seria possível, com certo distanciamento, classificar seis tendências arquitetônicas principais da pós-modernidade como paradigmas conceituais: o pluralismo, que se ampara na coexistência de elementos e discursos distintos; o simbolismo, com ênfase na dimensão simbólica e comunicativa da arquitetura com seu público; o contextualismo, que destaca valores, saberes, materiais ou técnicas construtivas regionais e locais; o historicismo, que interpreta formas arquitetônicas do passado de modo não convencional; o racionalismo, que incorpora as tipologias da tradição arquitetônica e apurados arranjos geométricos; e o tecnicismo, com ênfase nas inovações da indústria e tecnologia.

As referências ao cânone arquitetônico – seja por abordagem historicista, populista ou irônica – são ainda outro recurso comum entre as obras do pós-modernismo, epitomadas na praça-cenário Piazza d’Italia, em Nova Orleães, desenvolvida a partir de projeto de Charles Moore. Mesmo utilizando-se do pretexto de usar as ordens clássicas para “promover forte identidade da comunidade” ítalo-americana daquele trecho da cidade (MOOORE e DEL RIO, 1985), a praça acaba sendo pouco mais do que um paródia da tradição arquitetônica, problema recorrente em outras pós-modernas.

referências

COIMBRA, Juliano Moreira. Temas arquitetônicos e tendências pós-modernas em Pelotas, 1985-2005. 2017. 242 f. Dissertação (Mestrado em Arquitetura e Urbanismo)-PPG-FAU da Universidade Federal de Pelotas, Pelotas, 2017. Disponível em: http://guaiaca.ufpel.edu.br:8080/handle/prefix/5246 | Acesso em: 21 mai. 2021.

EAGLETON, Terry. As ilusões do pós-modernismo. Tradução: Elisabeth Barbosa. [edição digital]. Rio de Janeiro: Zahar, 2011.

HABERMAS, Jürgen. Arquitetura moderna e pós-moderna. Tradução: Carlos Eduardo Jordão Machado. Novos Estudos CEBRAP, São Paulo, n. 18, p. 115-124, set. 1987. Disponível em: http://novosestudos.com.br/produto/edicao-18/ | Acesso em: 21 mai. 2021.

HABERMAS, Jürgen. Modernidade - um projeto inacabado. Tradução: Márcio Suzuki. In: ARANTES, Otília B. Fiori; ARANTES, Paulo Eduardo (org.). Um ponto cego no projeto moderno de Jürgen Habermas: arquitetura e dimensão estética depois das vanguardas e duas conferências de Jürgen Habermas. São Paulo: Brasiliense, 1992.

JAMESON, Fredric. Pós Modernismo: a lógica cultural do capitalismo tardio. Tradução: Maria Elisa Cevasco. 2. ed. São Paulo: Ática, 1996.

JENCKS, Charles. The language of post-modern architecture. Nova Iorque: Rizzoli, 1977.

MOORE, Charles; DEL RIO, Vicente. Entrevista a Vicente del Rio. Módulo, São Paulo, n. 87, p. 76-77, set. 1985.

VENTURI, Robert. Complexidade e contradição em arquitetura. Tradução: Álvaro Cabral. São Paulo: Martins Fontes, 1995.

VENTURI, Robert; SCOTT BROWN, Denise; IZENOUR, Steven. Aprendendo com Las Vegas: o simbolismo (esquecido) da forma arquitetônica. Tradução: Pedro Maia Soares. São Paulo: Cosac Naify, 2003.

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